Da Coluna Política, no O POVO deste sábado (9), pelo jornalista Érico Firmo:
Nos próximos meses, Rodrigo Maia (DEM-RJ) será o principal agente da aprovação ou não da reforma da Previdência. Em entrevista à Globonews, na noite de quarta-feira, 7, Maia disse o seguinte: “Todo mundo consegue trabalhar hoje até 80, 75 anos”.
A frase de Maia é uma opinião. Mas, quando confronta dados objetivos, tem-se um problema. Pelo dado mais recente do IBGE, referente a 2017, sabe qual a expectativa de vida do brasileiro? De 76 anos. Quatro anos a menos que os 80 anos até os quais o presidente da Câmara dos Deputados acha que todo mundo pode trabalhar. Não disse que alguns podem trabalhar, nem mesmo que a maioria pode trabalhar. Disse “todo mundo”. Na média, a maioria dos brasileiros nem vive até lá. Isso é dado objetivo.
Trata-se, todavia, de uma média. Há gente que vive mais que isso, é óbvio. Porém, há os que vivem menos. A disparidade pode ser vista por sexo. A expectativa de vida dos homens é menor: 72,5 anos. Faltam, na média, dois anos e meio para atingir os 75 anos de piso, até os quais Maia acha que qualquer um pode trabalhar. As mulheres costumam viver mais. A expectativa de vida chegou a 79,6 anos. Ficam faltando alguns meses para alcançar os 80 anos até os quais Maia acha que qualquer um consegue trabalhar.
País desigual
O Brasil é muito grande, muito desigual e muito complexo. A Previdência precisa ser reformada sim, precisa de regras que considerem as transformações demográficas. Caso contrário, a economia quebra, há desemprego, inflação, recessão, o Estado não arrecada. Entre outros problemas, não há dinheiro nem para pagar essas aposentadorias, tampouco os funcionários em atividade. Com isso, os serviços públicos são afetados. Não é bom para ninguém. Há exemplos concretos disponíveis hoje mesmo.
Entretanto, essa reforma não pode ser feita de dentro dos gabinetes com ar-condicionado, olhando planilhas e desconsiderando o que há além dos relatórios atuariais. Se a intrincada realidade social do Brasil não for levada em conta, a reforma da Previdência poderá se mostrar uma tragédia social.
Como disse acima, a expectativa de vida do brasileiro é de 76 anos. Ressaltei se tratar de uma média. Em Santa Catarina, a expectativa de vida é de 79,4 anos. No Ceará, de 74,1 anos. No Maranhão, 70,9 anos. A diferença entre a maior e a menor é de oito anos e meio. Ou seja, a depender da região do Brasil, a perspectiva de vida de uma pessoa pode chegar a oito anos a mais ou a menos.
Isso sem considerar as disparidades dentro dos estados. Porque, se o Ceará tem expectativa de vida de 74,1 anos, a realidade de Fortaleza ou do Eusébio não é igual à de Salitre, Potengi ou Granja. As expectativas de vida não são iguais.
Se a reforma olhar o Brasil como uma coisa uniforme, se desconsiderar essas particularidades, provocará uma tragédia. Rodrigo Maia, ao dizer que “todo mundo consegue trabalhar hoje até 80, 75 anos”, fala de sua realidade Zona Sul do Rio de Janeiro. Fala dos círculos do Lago Sul de Brasília. Se você, leitor, considerar seu entorno, talvez ache a mesma coisa. A política pública precisa olhar além.
Maia ainda fez uma ressalva em seu “todo mundo”. “É claro que tem algumas categorias especiais, essas nós vamos tratar de outra forma”. São mais que categorias. São segmentos sociais inteiros. São os sertões, as periferias, as comunidades ribeirinhas da Amazônia. O Brasil é complexo e as simplificações podem se mostrar desastrosas.
A Previdência é a mais importante e eficaz política social do País. Ela evita ou atenua um terrível drama em potencial – a miséria entre idosos. Há municípios cuja economia é absolutamente dependente das aposentadorias.
A condução da reforma está nas mãos e em cabeças como a de Maia. Declarações como a destacada acima lança sérias dúvidas sobre o conhecimento e a capacidade para tocar algo que mexe tão fundo na vida da população.
Fonte: blogdoeliomar.com.br
10.02.2019