Para Bruna Bandeira, enfermeira do Hospital Regional do Cariri (HRC) e integrante da Organização de Procura de Órgãos e Tecidos (OPO) da unidade da Sesa na região, é importante que as pessoas sinalizem o interesse em serem doadores ainda em vida. “No Brasil, por lei, a doação é chamada ‘doação consentida’ e precisa ser autorizada pelo seu responsável legal. Por isso, é importante comunicar aos parentes o desejo de doar. Porque após o falecimento, quem decide são os familiares responsáveis legais, de primeiro e segundo grau (pais, irmãos, filhos e cônjuge)”, comenta.
Ainda de acordo com a enfermeira, uma das maiores dificuldades para redução da fila, ainda é a recusa familiar. No primeiro semestre de 2023, foram mais de 300 notificações de potenciais doadores no Estado, mas apenas 35% foi efetivada. O principal motivo, com 45%, foi por falta de autorização da família. Seguido, com 24%, pela contraindicação médica. “A Informação é fundamental para que a sociedade confie no sistema transplantes e compreenda a importância da doação de órgãos. Um único doador pode salvar até oito vidas”, destaca Bruna.
Ato de humanidade
Embora a doação de órgãos seja fundamental para salvar vidas, o tema ainda carrega estigma. E o papel dos profissionais de saúde é fundamental para acolher os familiares e fazê-los entender todo o processo, mesmo em um momento de dor. Esse é o compromisso diário dos membros das OPOs e Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT), que atuam nas unidades de saúde do Ceará.
Para Cibelle Bezerra, enfermeira do Banco de Olhos do Ceará (BOC), a entrevista familiar é um momento íntimo e único para os parentes do doador. “É sempre um momento emocionante e muito individual de cada família. Buscamos sensibilizá-los sobre a importância da doação. ‘Se você precisasse daquele órgão, você gostaria de receber?’ São alguns questionamentos que fazem as famílias refletirem. E, apesar do momento doloroso, muitos conseguem ressignificá-lo, dando a continuidade à vida de outras pessoas”, comenta.
Há dois anos realizando captações de córneas na região do Cariri, Cibelle se emocionou com o ato da família de Auricélia Calixto. Após a morte da professora, os familiares autorizaram a doação das córneas, como também iniciaram uma campanha nas redes sociais, divulgando a importância do ato de doar.
“Apesar da dor e da tristeza de toda a família. Sabemos que estamos fazendo o bem para alguém. Umas das melhores coisas que um ser humano pode fazer é se doar, ajudar quem necessita. Então, pensamos nisso. Estamos tristes, mas sabemos que alguém voltará a enxergar através dos olhos da Auricélia”, comenta Marcolina Leite, cunhada da doadora.
A decisão da doação partiu dos próprios filhos e do marido de Auricélia. E logo que decidiram pela doação, familiares compartilharam com parentes e amigos sobre o processo de doação. “Mesmo diante de um momento de dor, é uma atitude que serve para nos acalmar e confortar. É um ato humano, nobre. Que nossa sociedade possa perceber a doação de órgãos de forma mais humana. Se estamos partindo e não podemos mais estar aqui, então, ao menos uma parte nossa, por meio dos órgãos, estará salvando a vida de alguém”, concluiu.
Central de Transplantes do Ceará
A Central de Transplantes do Ceará funciona 24 horas, sete dias por semana, na sede da Sesa e coordena as atividades de transplantes no âmbito estadual. A central é responsável por regular a lista dos receptores de órgãos e tecidos, receber notificações de potenciais doadores, diagnosticados por morte encefálica, e articular a logística que torna a cirurgia de transplante possível.
Neste ano, 1.228 transplantes foram realizados até 26 de setembro. Dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) mostram a relevância do Ceará no que diz respeito à realização de procedimentos envolvendo córneas (2º lugar no País), fígado (3º), pâncreas (4º) e coração (5º).
Neste ano, 786 transplantes de córnea já foram realizados. Outros transplantes com maior volume de realização são os de fígado e rim, os quais totalizam, respectivamente, 151 e 147. Os de medula óssea somam 104, e os de coração, 21.