Arboviroses e maternidade: os riscos invisíveis que atravessam a gestação - Cariri Ativo - A Notícia Com Credibilidade e Imparcialidade
Anúncio

Arboviroses e maternidade: os riscos invisíveis que atravessam a gestação

Arboviroses e maternidade: os riscos invisíveis que atravessam a gestação

Compartilhar isso

 

Legenda: Pesquisadores defendem ampliação da cobertura vacinal contra a dengue e inclusão da vacina da chikungunya no calendário nacional
Foto: Fabiane de Paula

Estudo revela como dengue, zika e chikungunya impactam a gestação e reforça a urgência de ações coletivas para proteger mães e bebês.


Escrito por
Eliziane Correiaproducaodiario@svm.com.br


maternidade é cercada de cuidados e medos. Cada escolha parece exigir um tratamento especial, como se houvesse sempre contraindicações à espreita. Durante a gestação, esse zelo se intensifica: o medo de adoecer, de expor o bebê a infecções, de comprometer um sistema imune ainda frágil. Como mães, estamos sempre calculando riscos e benefícios, buscando proteger uma vida que depende inteiramente de nós.

Sempre tive consciência de que meus hábitos ditariam a gestação que eu teria. Procurei seguir de forma leve, acompanhando as orientações médicas, mas atenta ao que o mundo reagia em torno da saúde materna. Lembro de que, quando engravidei, o país vivia a preocupação com as arboviroses - dengue, zika e chikungunya - transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. A ameaça da zika, em especial, mexia com todas nós, gestantes, pois estava associada a riscos graves para o bebê, como má-formação congênita e parto prematuro.

Hoje, no entanto, a ciência mostra que não era apenas a zika que deveria estar no centro da atenção. Um estudo recente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicado na revista Nature Communications, analisou mais de 6,9 milhões de nascidos vivos no Brasil entre 2015 e 2020. A pesquisa revelou que a infecção por arboviroses durante a gestação aumenta o risco de parto prematuro, baixo peso ao nascer e até morte neonatal.

Segundo o líder da pesquisa, Thiago Cerqueira-Silva, a dengue, por exemplo, foi associada não só a partos antes do tempo e baixo peso, mas também a anomalias congênitas - alterações no desenvolvimento do feto. Já a zika confirmou impactos ainda mais severos, com risco de má-formação congênita mais que duplicado entre bebês de mães infectadas. A chikungunya, até então vista com menor preocupação, também mostrou ligação com morte neonatal e complicações graves.

“A zika era mais marcante quando a infecção acontecia no primeiro trimestre da gestação e aumentava o risco em anomalia congênita. Já dengue e chikungunya tinha maior risco no segundo, terceiro trimestre. A dengue tinha aumento de risco de parto prematuro e a Chikungunya também tinha o mesmo comportamento e aumento de risco de mortalidade neonatal”, explicou o pesquisador Thiago Cerqueira-Silva, da Fiocruz, um dos responsáveis pelo estudo.

Vigilância e prevenção

Os cientistas destacam ainda que os riscos variam conforme o trimestre da gestação em que ocorre a infecção, sugerindo diferentes mecanismos biológicos em cada fase. Essa descoberta reforça a necessidade de vigilância e prevenção ao longo de toda a gravidez.

Mas a prevenção não pode recair apenas sobre os ombros das gestantes. Em comunidades vulnerabilizadas, onde a exposição ao mosquito é maior, os efeitos tendem a ser ainda mais severos. Além disso, os custos financeiros e emocionais do cuidado com crianças que nascem com complicações recaem desproporcionalmente sobre famílias de baixa renda.

Por isso, os pesquisadores defendem a urgência de ampliar a cobertura vacinal contra a dengue e incluir a vacina da chikungunya no calendário nacional de imunização. 

“É preciso garantir que as vacinas sejam oferecidas gratuitamente e com ampla cobertura, independentemente da condição socioeconômica. Só que até o momento a gente não tem estudo olhando para a segurança da vacina da dengue em grávidas. O ideal seria incluir a vacinação para a população geral, que já vai proteger as mulheres em idade fértil. A vacina da chikungunya até já foi aprovada, mas não tem nenhuma previsão de implantação no Programa Nacional de Imunização no Brasil.” concluiu Thiago.

Desafio coletivo

O pesquisador também destacou a importância de investir em campanhas educativas que informem a população sobre os riscos das arboviroses e as formas de prevenção. Quando uma pessoa é infectada, passa a precisar de mais cuidados médicos, o que gera aumento nos custos dos serviços de saúde.

"Durante o pré-natal, caso a gestante apresente sintomas semelhantes aos da dengue ou chikungunya, é essencial intensificar o acompanhamento médico, reduzindo os intervalos entre as consultas. Como não há tratamento específico para essas arboviroses, o foco deve estar no monitoramento constante da gestante para identificar precocemente qualquer complicação e agir de forma adequada."

A ciência lança um alerta importante: proteger a vida que cresce no ventre não pode ser apenas tarefa da mãe. É um desafio coletivo, que envolve políticas públicas, equidade social e responsabilidade compartilhada. Porque cuidar de quem gera vida é cuidar do futuro de todos nós.

diariodonordeste.verdesmares.com.br

Cariri Ativo

07.10.2025