Medicamento quase triplica a sobrevida dos pacientes, com redução de 59% no risco de progressão do câncer ou morte.
Para ser aprovado, o tratamento inédito passou por diversos estudos que comprovaram que a droga quase triplica a sobrevida dos pacientes, com redução de 59% no risco de progressão do câncer ou morte.
Batizado de Blenrep (belantamabe mafodotina), o remédio é um anticorpo conjugado, indicado para o tratamento de pacientes que tiveram recaída da doença ou que já tenham recebido pelo menos uma linha de tratamento anterior.
A terapia deve estar disponível em até 90 dias na rede privada de saúde. A novidade foi anunciada pela farmacêutica GSK em evento para a imprensa nessa terça-feira (28), em São Paulo.
Ineditismo do medicamento
De causa ainda desconhecida, o mieloma múltiplo é um tipo de câncer no sangue caracterizado pela proliferação de plasmócitos malignos, que afeta a medula óssea e compromete a produção normal de células sanguíneas.
Entre os sintomas mais comuns estão dor óssea, fadiga, anemia, infecções recorrentes, insuficiência renal, perda de peso, sudorese e febre.
Conforme Vania Hungria, médica hematologista que liderou os estudos, o novo tratamento ajuda a controlar essa hiperinflamação do corpo causada pela doença, evitando que uma "cicatriz" se forme na medula óssea.
O medicamento é uma combinação de bortezomibe (quimioterápico) e dexametasona (corticoide), tecnologia que une a precisão dos anticorpos monoclonais com a potência dos agentes citotóxicos, atingindo de forma seletiva as células que estão doentes com os tumores.
A farmacêutica responsável pelo medicamento explica que o Blenrep apresenta um mecanismo de ação multimodal único, que combina uma imunoterapia com uma terapia alvo. Essa liberação veloz da carga citotóxica faz com que o paciente tenha uma resposta geralmente rápida ao tratamento.
O remédio também se demonstrou eficaz na redução da anemia e da necessidade de transfusão de sangue, tão comum entre os pacientes com mieloma múltiplo e outras doenças hematológicas.
Como funciona o tratamento?
A droga, um conjugado de anticorpo-fármaco, tem uma combinação que permite a ligação seletiva às células do mieloma, liberando o agente quimioterápico no interior da célula e induzindo sua morte.
O remédio é administrado por infusão intravenosa a cada três semanas ou a cada quatro semanas, a depender da combinação do tratamento.
Pesquisa
Os estudos contaram com participação expressiva do Brasil, com pacientes recrutados em 8 centros de pesquisa diferentes. Intitulada de DREAMM-7, a pesquisa avaliou belantamabe mafodotina em combinação com bortezomibe e dexametasona (BVd) em pacientes com mieloma múltiplo que tiveram recaídas ou apresentaram resistência a outros tratamentos.
O estudo constatou que a sobrevida livre de progressão da doença quase triplicou entre os pacientes submetidos à terapia, com redução de 59% no risco de progressão ou morte.
Os resultados demonstram um benefício expressivo para os pacientes, com aumento de sobrevida livre de progressão da doença e ganho de sobrevida global. A participação do Brasil nesses estudos reforça a importância do país no cenário internacional de pesquisa clínica e amplia o acesso a terapias inovadoras para pessoas que enfrentam o mieloma múltiplo.
Já os efeitos colaterais mais significativos associados ao tratamento foram alterações oculares, como pequenos cistos.
Durante o estudo, esses efeitos adversos nos olhos ocorreram em 79% dos pacientes do grupo que utilizou BVd, sendo necessário suspender o medicamento em 28% dos casos.
Apesar dessa complicação, a pesquisadora afirma que a maioria dos casos é reversível. Ela destaca a necessidade de um oftalmologista para avaliar e acompanhar o paciente antes de iniciar o tratamento.
A pesquisa que comprova a eficácia do Blenrep para o tratamento do mieloma múltiplo foi publicada no periódico The New England Journal of Medicine, um dos mais respeitados do mundo. A terapia já foi aprovada no Reino Unido, União Europeia, entre outros países.
Cenário da doença no Brasil

O mieloma múltiplo é o segundo câncer hematológico mais presente no Brasil, com cerca de 7 mil novos casos por ano. Os especialistas citam que a demora no diagnóstico ainda é um dos maiores desafios da doença no Brasil.
A queixa mais frequente dos pacientes são dores nas costas, um sintoma muito comum também em outras doenças menos complexas.
"Temos um exame de sangue simples, a eletroforese de proteínas, que muitas vezes não é solicitado pelos médicos, mas que pode ajudar muito na suspeita de diagnóstico da doença. Os médicos medicam, mas não exploram a causa, o que dificulta o diagnóstico”, pontua Vania Hungria.
Mesmo com os avanços da medicina, o mieloma múltiplo ainda não tem cura. Os pacientes costumam apresentar recaídas frequentes, e os resultados dos tratamentos tendem a piorar a cada nova etapa terapêutica.
Muitos pacientes não conseguem chegar às fases mais avançadas da terapia devido à rápida progressão do câncer, o que reforça a necessidade de medicamentos eficazes já nas primeiras recaídas.
'Cura funcional'
Apesar de não haver uma cura total, Vania Hungria fala em “cura funcional”, com relato de pacientes com até 15 anos sem progressão da doença e vivendo com qualidade de vida.
Esse cenário é bem diferente de décadas atrás, quando pessoas diagnosticadas com mieloma eram submetidas apenas a tratamentos considerados paliativos, que ofereciam, no máximo, uma sobrevida de dois ou três anos.
Além dos sintomas como dores, infecções e anemia, pessoas que vivem com a doença enfrentam impactos na vida social e também no mercado de trabalho, com queda na produtividade, invalidez por razões médicas, necessidade de licença para afastamento e aposentadoria. Além de comorbidades associadas como depressão (12%), ansiedade (31%) e disfunção sexual (64%).
Assim, a chegada da nova opção de tratamento é vista com otimismo pelos especialistas.
“Com as novas terapias, não estamos mais falando só de tempo ou de sobrevida, mas sim de vida, de mais tempo com qualidade de vida”, diz Christine Battistini, presidente da International Myeloma Foundation na América Latina.
Diagnóstico precoce será debatido em comissão no Senado
A Comissão de Assuntos Sociais informou, nesta quarta-feira (29), que irá realizar um debate para instruir a votação do projeto (PL 2364/2021) do deputado federal Alex Manente que institui a campanha Março Borgonha, para prevenir e conscientizar a população sobre a importância do diagnóstico precoce do mieloma múltiplo.
Autora do pedido do debate, a senadora Dra. Eudócia enfatizou que a doença é responsável por 10% de todos os cânceres hematológicos.
*A repórter viajou a São Paulo a convite da farmacêutica GSK para o evento de divulgação do novo tratamento.
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Cariri Ativo
30.10.2025


