A dupla foi absolvida pelo crime de integrar organização criminosa. Duas hilux pertencentes a secretarias do Governo do Estado foram utilizadas no esquema ilegal.
O Código Penal Brasileiro configura crime de peculato como "conduta do funcionário público que desvia, em proveito próprio ou alheio, bem móvel de que tem a posse em razão do cargo".
Conforme a sentença, obtida pelo Diário do Nordeste, a pena dos réus João Paulo Pontes Vieira e Antônio Vieira da Silva Neto ficou decidida em quatro anos e nove meses de prisão em regime semiaberto. Inicialmente, eles também foram indiciados e denunciados pelo crime de organização criminosa, mas a Justiça optou por absolvê-los devido à falta de evidências.
O fato que levou os acusados a estarem diante do Poder Judiciário aconteceu em 2022. Segundo documentos obtidos pela reportagem, no dia 20 de julho de 2022, duas Hilux foram furtadas do pátio da Secretaria das Cidades, no bairro Cambeba, em Fortaleza, e levadas a um desmanche para serem adulteradas e posteriormente vendidas a terceiros.
A ação criminosa teria sido planejada pelos réus, embora, durante os memoriais finais, ambas as defesas técnicas tenham imputado mutuamente a culpa pela iniciativa, fator desconsiderado pelo magistrado. "A controvérsia sobre quem teve a ideia inicial é irrelevante para a configuração do concurso de agentes, uma vez que ambos aderiram à conduta e contribuíram para o resultado", diz a sentença.
Para a reportagem, a defesa de Antônio Vieira da Silva Neto, composta pelos advogados Gustavo Sampaio Brasilino de Freitas e Francisco Evaldo Pereira de Morais Filho, disse que desde o começo "foi diligente e firme em aduzir que nunca se tratou de uma organização criminosa, como fez parecer a denúncia ministerial, e, com a absolvição, a justiça foi feita".
"Quanto à condenação pelo suposto peculato, estamos estudando o recurso para que o Tribunal reaprecie algumas nuances da situação", finaliza a equipe.
A defesa de João Paulo Pontes Vieira não foi identificada. O espaço segue aberto para futuras manifestações, e a matéria será atualizada, se houver manifestação da defesa.
Entenda como o esquema funcionava
A denúncia do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) narra que a ideia inicial dos acusados era comercializar um veículo modelo D20, devolvido pela Secretaria da Fazenda (Sefaz) a Secretaria do Planejamento e Gestão (Seplag), onde os servidores eram lotados, alguns dias antes.
Isso teria acontecido em junho de 2022, um mês antes da venda das Hilux. Até então, o plano era obter o valor da transação da D20 e, em seguida, destruir a documentação relacionada para que os órgãos acreditassem que o veículo estava no acervo de outra secretaria.
Em depoimento, Antônio Vieira afirmou que João Paulo o pediu para encontrar contatos de sucatas que aceitassem levar os veículos para desmanche.
João Paulo solicitou ajuda para encontrar sucatas e, embora Antônio não tivesse contatos na área, decidiu procurar no Google e passou alguns contatos para João Paulo. A partir daí, João Paulo tratou de todas as questões relacionadas à venda. Antônio explicou que, inicialmente, o interessado não quis comprar a D20, e João Paulo então ofereceu Hilux das secretarias das cidades.
Um dos contatos encaminhados por Antônio a João Paulo era do pai de Thiago Silva Nunes, dono de uma sucata localizada próxima à sede da Seplag. Thiago aceitou mediar a negociação, e, no dia 20 de julho, foi pessoalmente à secretaria junto do cliente dele, Denis Vinícius Rodrigues Xavier, para verificar as condições dos veículos.
João Paulo teria recebido os dois empresários sozinho, pois Antônio Vieira estava de férias. O episódio teria acontecido em plena luz do dia, sob a presença de outros servidores. Após breve análise, a compra foi selada.
Foi o valor pago a João Paulo pelas duas Hilux. A quantia foi enviada da conta da esposa de Thiago, pois, segundo ele, "estava sem limite no banco".
Dois dias depois, servidores da Seplag avistaram um caminhão-reboque levando embora os dois veículos para o desmanche de Denis Vinícius. Conforme as investigações, o intuito da ação ilegal era de remover os sinais identificadores dos carros e receber o dinheiro das vendas para benefício próprio.
Enquanto isso, Antônio Vieira relatou às autoridades que recebeu uma alta quantia de João Paulo para "permanecer em silêncio", apesar de estar de férias. Ele também relatou que não sabia se o dinheiro tinha vindo da venda de um ou dos dois veículos.
"João Paulo também depositou R$ 5 mil na conta de Antônio, mas ele não foi informado sobre a origem ou a natureza do dinheiro. Antônio relatou que, ao tentar entrar em contato com João Paulo, descobriu que a polícia já estava envolvida e ficou preocupado com a situação, sabendo que poderia ser implicado devido ao dinheiro depositado em sua conta", descreve a denúncia do MPCE.
Acusados foram presos e afastados dos cargos
A Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) tomou conhecimento do ocorrido a partir do dia 27 de julho de 2022, quando um Boletim de Ocorrência (B.O) foi registrado na então Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC) relatando o desaparecimento das duas Hilux.
Por meio de câmeras de videomonitoramento, os agentes localizaram a placa do caminhão-reboque, e descobriram que este pertencia à sucata de Denis Vinícius. Os veículos foram localizados no local indicado pelo então suspeito, já em processo de desmanche.
Segundo reportagem publicada pelo Diário do Nordeste na época dos fatos, nesse mesmo dia, Denis e Thiago foram presos em flagrante. Simultaneamente, os servidores foram afastados dos cargos e, em agosto de 2022, iniciaram o cumprimento de prisão preventiva, que durou até setembro de 2022, quando passaram a ser monitorados por tornozeleira eletrônica.
*Estagiário sob supervisão do jornalista Emerson Rodrigues
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Cariri Ativo
30.10.2025


