Em entrevista ao Diário do Nordeste, Fernanda Pacobahyba diz que o Governo Federal tem realizado uma pesquisa para tentar ter esse dado de forma precisa.
A titular do FNDE participou do evento organizado pelo Governo Federal por meio do Ministério da Educação (MEC) e do próprio FNDE, em parceria com o Secretariado da Coalizão, presidido pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA) da Organização das Nações Unidas (ONU). O encontro reúne mais de 90 países.
No Brasil, no atual modelo, a União repassa verbas, através do FNDE para suplementar a compra da alimentação escolar e cobrir os 200 dias letivos nas escolas públicas brasileiras, conforme o número de estudantes matriculados em cada rede de ensino. Esses valores, em alguns casos, chegam a ser de menos de R$ 1,00 por dia e por aluno. Mas, a situação é tão complexa que, em muitos casos, a verba que é complementar é a única usada por municípios e estados para garantir a compra dos alimentos.
Fernanda, o Governo Federal está à frente da 2ª Cúpula Global da Coalizão para a Alimentação Escolar e tem realizado debates, reuniões com outros países, dentre outras atividades. Na prática, como esses encontros e trocas podem ajudar o Brasil a melhorar essa dimensão da educação e como esse multilateralismo e bilateralismo tem cooperado para a educação brasileira?
No caso, nós temos uma Coalizão Global que hoje completou 111 países. E por que esse monte de vínculo? De fato, o mundo olha pro Brasil e reconhece no Brasil uma liderança natural por conta do nosso Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). É um programa que não é de hoje, é um programa que tem 70 anos no Brasil e, ao longo desse tempo, ele foi evoluindo muito.
Logicamente, mudou enormemente, mas é uma coisa que o mundo prestigia a longevidade e a expertise que o nosso programa alcançou. Então, não só as pessoas vêm pra cá pra compreender como é o nosso programa, já que os países têm curiosidade de entender ‘como é que vocês conseguem fazer um programa de alimentação escolar num país continental?’
A nossa alimentação aqui no Ceará é uma, no Norte é outra. Você vai pros gaúchos e a outra é totalmente diferente, centro-oeste. Então, assim são muitos Brasis e também a dificuldade de logística de transportar os alimentos, de fazer com que ele chegue às escolas, nós temos o ritmo de 140 mil escolas. Então, é muita gente.
Fazer 50 milhões de refeições, ter nutricionista, ter merendeira, é uma cadeia muito boa. Então isso fez com que o Brasil seja co-presidente da Coalizão Global. Praticamente por aclamação. E a gente trouxe esse evento para o Ceará por todos os símbolos que a gente tem aqui no Brasil em relação a isso.
O ministro Camilo Santana (PT) falou na lei que já foi aprovada e que o presidente Lula deve sancionar em breve que aumenta de 30% para 45% o que deve ser destinado de verba da alimentação escolar para a agricultura familiar. Vocês já têm data para a sanção?
Estamos ansiosos. O presidente estava numa agenda internacional aí deve estar na no próxima semana mas eu acho que não tarda. E pra gente é uma super vitória.
E aqui no Ceará, o Governo aprovou o Projeto de Lei 131/2023, que proíbe ultraprocessados na alimentação de escolas públicas e particulares do Ceará e inclusive zera esse tipo de compra até 2027 nas instituições de ensino. Hoje, tem alguma perspectiva que normas do Governo Federal caminhem nesse sentido?
É um excelente horizonte. O Governo Federal já tem um decreto que foi publicado ano passado pelo presidente Lula que é mais ou menos esse desenho do Ceará. Só que o Governo Federal não tem competência para impor, então, assim o que o governador Elmano fez foi sair na dianteira. Do que nós temos conhecimento, é a primeira unidade da federação que torna essa regra imperiosa, obrigatória.
E o que eu acho que é mais interessante é que toda legislação que a gente tem da alimentação escolar no Brasil, ela é direcionada às escolas públicas. Lógico que 85% dos brasileiros estão em escola pública na educação básica, mas você tem 15% na escola privada e as escolas privadas praticamente estavam sem regulamentação relacionada à alimentação escolar.
A legislação que o Ceará aprova é uma legislação que vem em boa hora porque a notícia que eu tenho é que ela atinge escolas públicas e privadas. É um super avanço. Porque existem lobbys muito fortes especialmente dos ultraprocessados.
Fernanda, a senhora também falou sobre a experiência do município de Tauá, sobre o destaque relacionado à presença da agricultura familiar na alimentação escolar. É um exemplo para o Brasil?
Hoje, 100% dos recursos que o Governo Federal coloca em Tauá para alimentação escolar vai para a agricultura familiar. Eles conseguiram, ao longo do tempo, desenvolver algumas cooperativas muito fortes. Eu consegui presenciar lá, fui em algumas cooperativas e lá produz polpa, produz fruta. No meio do sertão. É uma das regiões do Ceará com o menor índice pluviométrico, praticamente não chove e Tauá tem um exemplo estruturado na alimentação escolar.
Então, foi muito bom conhecer e é muito bom falar desse exemplo de Tauá para o Brasil. Porque se Tauá pode, pra mim qualquer cidade do Brasil pode.
Outro assunto que a senhora já escreveu e falou sobre é a questão da dependência que os municípios têm desse recurso do Pnae, uma dependência considerada muito alta em diversos casos. O que deveria ser complementar é quase um recurso único. O que é possível fazer para tentar sair dessa situação?
Uma coisa que a gente precisa discutir no Brasil e tem sido uma luta muito forte do ministro Camilo é que a gente precisa aumentar o dinheiro que o Estado brasileiro coloca na educação como um todo, ponto. Isso naturalmente vai fazer com que carreie mais recursos para alimentação escolar.
Então, hoje quando você pega a educação básica e compara o quanto a gente investe por aluno, compara com os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) o Brasil investe um terço do que os países da OCDE investe.
A gente estava com a Espanha aqui agora (em reuniões na 2ª Cúpula Global da Coalizão para a Alimentação Escolar), um país integrante e eles investem três vezes mais. Estava pouco com o ministro do Chile, o Chile investe por criança por dia, dois dólares. Dois dólares dá 12 reais. O nosso per capita aqui são centavos, um real e pouco. Então assim, no bolo o estado brasileiro precisa botar mais dinheiro na educação. Isso é um grande desafio.

Mas ao mesmo tempo a gente precisa, os prefeitos e os governadores precisam compreender que esse papel não é só do governo federal. A constituição diz que os nossos programas são suplementares, eles precisam também aportar recursos.
Hoje, no Congresso, está na relatoria da senadora Augusta Brito (PT) um projeto que vai discutir a Política Brasileira da Alimentação Escolar. Hoje a gente tem a política nacional e a gente vai discutir a política brasileira. A política brasileira vai focar no financiamento, para dizer quanto é que custa hoje, já que o Brasil ainda não tem esse dado.
A gente está em vias de fechar esse dado. Quanto é que custa hoje para alimentar um menino numa escola de tempo integral no Ceará? A gente não tem esse dado estruturado. Porque os sistemas orçamentários da União não conversam com os estados, não conversam com os municípios. Então assim é muito complexo esse número. Mas nós vamos ter.
Aí vamos imaginar que a conclusão que um aluno custa, sei lá, 10 reais por dia. A União vai entrar com quanto? A nossa proposta é que a União não entre com menos do que 60%. A partir daí, os 40%, o prefeito tem que colocar, o governador tem que colocar. A gente vai entrar nessa discussão nacional. Logicamente vai precisar trazer mais recursos. O Governo Federal vai ser chamado talvez a aportar mais recursos, mas os estados e os municípios precisam compreender a importância.
E quando o Governo projeta que o país terá essa estimativa do custo da alimentação por aluno?
O projeto está tramitando. Acho que em seis meses a gente consegue ter os primeiros dados para uma discussão mais rigorosa no Congresso. O FNDE está fazendo uma contratação de uma consultoria justamente para ter esse dado.
Fernanda, e no caso dos reajustes que precisam ser feitos nos valores da Pnae. Depois de muitos anos, esses valores foram reajustados em 2023, mas depois, o Governo não tem tido autorização do Congresso na lei orçamentária, por exemplo, para esse finalidade. Como lidar com o conflito de os preços irem perdendo o valor de compra na ausência dessa atualização?
A inflação vai corroer o poder de compra de qualquer jeito. Então, assim, realmente a gente tem que contar com a sensibilidade do Congresso para aportar mais recursos. Porque não dá para o MEC ofertar o aumento na alimentação escolar tendo que cortar do FUNDEB, tendo que cortar do programa de ônibus, tendo que cortar do salário da educação. A gente espera que os nossos congressistas sejam sensíveis de trazer esse recurso de outros pontos de arrecadação.
Outro ponto que tem sido discutido no Congresso é a questão do SUS da Educação, a criação do Sistema Nacional da Educação. Como que o FNDE entra nesse debate? Tem algum fator específico que o projeto pode contribuir no estabelecimento de instrumentos para viabilizar a alimentação escolar?
Ele vai dizer o que é o papel de cada ente, quem é que entra com o quê e qual é a educação que a gente quer. Então o sistema é fundamental. O projeto da política brasileira de alimentação escolar pode ser um capítulo dentro do Sistema Nacional de Educação. E o FNDE entra em que medida? Porque o FNDE é o órgão que financia as políticas públicas. Então, toda a parte de assistência passa pelo órgão e a gente é contemplado pelo Sistema Nacional. É o financiador da educação brasileira no tocante à União.
diariodonordeste.verdesmares.com.br
Cariri Ativo
22.09.2025