Autor Bianca Nogueira
Um relatório publicado na última terça-feira, 23, pelo Climate Crisis Advisory Group (CCAG), traz um alerta e uma oportunidade: cortar as emissões de metano é a forma mais rápida, barata e eficaz de frear o avanço da crise climática.
O documento afirma que uma redução de 45% até 2030 pode evitar até 0,3°C de aquecimento, efeito crucial para limitar os impactos da mudança do clima.
Embora as atenções globais estejam concentradas no dióxido de carbono (CO₂), o estudo lembra que o metano responde por cerca de 30% do aquecimento já observado e tem um efeito mais de 80 vezes potente do que o CO₂.
A diferença é que, ao permanecer apenas pouco mais de uma década na atmosfera, cada corte nas emissões gera um resultado quase imediato: um alívio perceptível em poucos anos.
Brasil: entre risco e oportunidade
O Brasil ocupa lugar central nesse desafio. Mais de 70% das emissões nacionais de metano vêm da agropecuária, sobretudo da criação de gado. Resíduos e energia completam a conta.
Essa configuração, destacam os autores, coloca o país tanto como um dos maiores riscos, quanto como uma das maiores oportunidades de liderança no combate climático.
O relatório cita o programa federal “Zero Metano”, lançado em 2022, mas avalia que a iniciativa carece de metas claras e de mecanismos robustos de monitoramento. Sem avanços concretos, advertem os cientistas, a política pode se tornar apenas simbólica, em vez de se integrar a estratégias agrícolas e de uso da terra mais abrangentes.
Energia, agricultura e resíduos: medidas de baixo custo
O estudo lista ações de baixo custo e de impacto imediato em três frentes principais:
Energia
- Proibir o venting — liberação direta de metano na atmosfera.
- Encerrar o flaring rotineiro — queima de gás em poços de petróleo e gás.
- Estabelecer monitoramento rigoroso de vazamentos, com reparo imediato.
- Garantir relatórios independentes e transparentes sobre emissões.
Agricultura
- Fixar limites rígidos de intensidade de metano em grandes fazendas de corte e leite.
- Exigir manejo responsável do esterco, com tratamento e armazenamento adequados.
- Incentivar práticas alimentares que reduzam as emissões de ruminantes.
- Apoiar pequenos produtores com infraestrutura, capacitação e recursos.
- Diminuir emissões da produção de arroz e aquicultura com manejo sustentável.
Resíduos
- Ampliar a coleta universal, reciclagem e desvio de materiais de aterros.
- Impedir que resíduos orgânicos cheguem a lixões, destinando-os a compostagem, biogás ou biochar.
- Reformar cadeias alimentares, reduzir desperdício e promover dietas de baixa emissão.
- Envolver comunidades locais e trabalhadores informais em sistemas circulares de resíduos.
- Monitorar rigorosamente aterros e investir em captura de metano.
Freio de emergência
A ecóloga Mercedes Bustamante, professora da Universidade de Brasília (UNB) e integrante do CCAG, avalia que o momento exige ação e visão estratégica.
“A oportunidade de combater a mudança do clima por meio da redução das emissões de metano é também uma oportunidade de reformular nossos sistemas agroalimentares. Isso significa dar mais transparência sobre os impactos da cadeia de produção de alimentos, melhorar a sustentabilidade, garantir água e segurança alimentar, proteger a saúde e promover justiça social”, afirma.
Na mesma linha, David King, presidente do grupo internacional, reforça que a janela de oportunidade está aberta — mas não por muito tempo:
“O metano é o único freio de emergência que temos à disposição. As soluções estão prontas, são acessíveis e trazem ganhos imediatos para a saúde, a segurança alimentar e os meios de vida. Em países como o Brasil, onde a agricultura é parte central da economia, não agir equivale a investir na própria queda.”
Quem assina o relatório
O Climate Crisis Advisory Group reúne especialistas de renome internacional em ciência do clima, emissões de carbono, energia, meio ambiente e recursos naturais.
Alguns de seus membros participam de conselhos consultivos governamentais, mas o papel do CCAG é atuar de forma complementar, oferecendo análises independentes sobre dimensões políticas e financeiras que muitas vezes ainda não estão presentes nas agendas oficiais.
Todos os cientistas atuam de forma voluntária, sem qualquer remuneração.
opovo.com.br
Cariri Ativo
29.09.2025